O inquérito da DECO sobre as forças policiais revela que há cada vez mais pessoas a apresentar queixa na polícia. Mas uma percentagem elevada ainda acha que não vale a pena. Conheça os passos a dar para apresentar uma queixa e como ter direito a proteção jurídica gratuita.
Apesar de a criminalidade ter
reduzido em Portugal, há cada vez mais cidadãos a apresentar queixa: 65%, em
2018, contra 45%, em 2007. Esta é uma das conclusões do nosso inquérito
realizado a cerca de mil portugueses, dos 25 aos 74 anos, entre outubro e
novembro de 2018, sobre as forças policiais. Uma percentagem elevada está,
porém, convencida de que não vale a pena participar um crime à polícia porque, na
prática, não surtirá qualquer efeito.
Na verdade, apenas dois em 10 cidadãos que apresentaram queixa se revelaram bastante satisfeitos com o resultado da mesma. Não é de surpreender. O nosso questionário leva-nos a concluir que, em 59% dos casos, os criminosos não foram identificados e 22%, apesar de terem sido assinalados, não foram sequer levados a tribunal. A percentagem de vítimas que vê os seus bens totalmente recuperados não chega a 10 por cento.
A esmagadora maioria das queixas é apresentada na PSP (62%) e na GNR (32 por cento). No geral, as vítimas mostram-se satisfeitas com os serviços policiais. No entanto, um terço considera o procedimento demasiado burocrático e um quinto avaliou negativamente o tempo de espera até ser atendido. Quase metade das vítimas também se queixou do conforto das infraestruturas. A polícia tentou desencorajar a vítima em 10% das situações.
Quase metade dos inquiridos confia na polícia. Uma parte significativa (39%) preferiu, no entanto, ser mais comedida na lisonja, sendo que 14% revelaram confiar pouco. Segundo o nosso estudo, os inquiridos que usufruem de uma situação económica desfavorável confiam menos. O mesmo acontece com quem foi vítima de um crime.
Mais de metade considera que a eficiência da polícia é muito limitada pela ausência de infraestruturas e de equipamento, bem como restrições que limitam a sua capacidade de ação, por exemplo, no uso de armas. Seis em dez inquiridos também creem que não há efetivos suficientes para assegurar um bom serviço.
Portugal é um país seguro
De acordo com o Instituto de
Economia e Paz, Portugal é o quarto país mais seguro do mundo. Segundo dados do
Ministério da Administração Interna, a criminalidade apresenta níveis
inferiores à média europeia, tendo o número de participações diminuído 21% em
dez anos (333 223 contra 421 037).
Esta tendência de queda é confirmada pelos resultados deste nosso último inquérito, e de outros realizados em anos anteriores. Se compararmos os resultados, verifica-se que a prevalência de vítimas de crime em Portugal desceu de 41%, entre 2002 e 2006, para 31%, entre 2013 e 2017.
Três quartos dos portugueses sentem-se muito seguros no conforto do lar durante o dia. Este sentimento de segurança é extensível ao bairro onde vivem ou trabalham, embora aqui só seis em dez se sintam totalmente à vontade.
À noite, a sensação de conforto diminui, sobretudo nos transportes públicos, onde 28% admitiram sentir receio, ainda que, segundo os dados oficiais publicados no Relatório Anual de Segurança Interna, as participações de roubos nos transportes tenham diminuído significativamente (menos 29% em 2018 face a 2016). Um quinto também revela insegurança à noite na cidade, no bairro e na zona onde trabalha.
Apesar de uma parte significativa dos cidadãos nutrir uma confortável sensação de segurança, 70% dos inquiridos gostariam que o nível de vigilância da polícia aumentasse ao longo do dia. O número de pessoas que a considera insuficiente sobe para 84% à noite. Mais uma vez, quem vive na capital respondeu mais nesse sentido.
Como fazer a queixa
1. Onde apresentar? − Basta
dirigir-se a uma esquadra da Polícia de Segurança Pública (PSP), a um posto da
Guarda Nacional Republicana (GNR), a um piquete da Polícia Judiciária (PJ) ou
apresentar a queixa diretamente junto dos Serviços do Ministério Público,
exigindo um documento comprovativo. Pode ainda apresentar uma queixa eletrónica
ou denúncia através do site.
2. Em que circunstâncias? − Face a um crime público, qualquer pessoa pode apresentar queixa, ainda que não seja vítima (violência doméstica). Mesmo que o ofendido se arrependa e queira desistir, o processo continua. Nos crimes semipúblicos (furto), é necessária queixa (por regra, do ofendido). Nos crimes particulares, o ofendido tem de se constituir como assistente (injúrias).
3. Como denunciar um crime? − Se o crime tiver natureza pública (assalto/roubo, corrupção, por exemplo), qualquer cidadão o pode denunciar, mas não é obrigado a tal. Não tem de saber a identidade do autor, nem contratar advogado — tão pouco pagar, ou conhecer o nome do crime. Se este tiver natureza particular (difamação ou injúrias), o ofendido tem de se constituir assistente no processo, o que implica ter advogado e pagar taxa de justiça.
4. Qual o prazo? − Estando em causa crimes dependentes de queixa (crimes semipúblicos e particulares), a mesma tem de ser apresentada no prazo de seis meses a contar da data em que o titular teve conhecimento do facto e dos seus autores, sob pena de extinção daquele direito.
5. É preciso pagar? − A regra é a de que não é preciso pagar qualquer quantia para que a vítima de um crime se queixe ou o denuncie, ou para que um cidadão denuncie um crime público de que teve conhecimento. A exceção é para os crimes particulares, em que se paga taxa de justiça para se constituir assistente.
6. É preciso advogado para fazer uma queixa ou denunciar um crime? − Não é preciso advogado para apresentar uma denúncia criminal. Mas, se a vítima quiser ser assistida no processo penal, tem esse direito e pode contratar advogado livremente. Se não tiver meios económicos para tal, pode pedir a concessão de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, junto de qualquer serviço da Segurança Social.
7. É possível desistir da queixa? − Sim, mas só no caso de se tratar de crimes semipúblicos (furto). O mesmo não acontece no crime de violência doméstica, que tem natureza pública. Feita a denúncia ou participação, a vítima não pode desistir.
DECO / Myriam Gaspar e Nuno César
A proteção jurídica é um direito das pessoas singulares e coletivas, que não tenham condições económicas de acederem ao direito e aos tribunais.
A proteção jurídica inclui:
● Consulta jurídica – consulta
com um advogado para esclarecimento técnico sobre o direito aplicável a
questões ou casos concretos nos quais avultem interesses pessoais legítimos ou direitos
próprios lesados ou ameaçados de lesão (não se aplica às pessoas coletivas sem
fins lucrativos)