Há
etapas comportamentais comuns nos homens que matam as companheiras – e isso
pode ajudar a polícia a prevenir mais mortes, avança investigadora britânica. "Só contabilizando o ano de 2017, o número de mulheres mortas por antigos e atuais parceiros é qualquer coisa como 30 mil"
Os
dados são da especialista em criminologia Jane Monckton Smith, que encontrou um
padrão de oito etapas em 372 mortes por violência doméstica ocorridas nos
últimos anos no Reino Unido. Professora universitária, em Gloucester, Monckton
Smith está agora esperançosa que, ao conhecerem-se alguns dos comportamentos
comuns, seja possível identificar melhor o risco de alguém ser morto pelo
companheiro. E isso é tanto mais importante quando sabemos que, a nível mundial,
e só contabilizando o ano de 2017, o número de mulheres mortas por antigos e
atuais parceiros é qualquer coisa como 30 mil – os dados são da BBC.
Para
conduzir o seu estudo, a investigadora analisou os casos elencados no site
Counting Dead Women, o equivalente local ao nosso Observatório das MulheresAssassinadas, da UMAR, em que a mulher assassinada mantinha qualquer tipo de
relacionamento com o agressor.
Eis,
então, as etapas comuns nos casos que acabaram em morte: história anterior de
perseguição ou abuso por parte do perpetrador; a rapidez com que o romance se
torna um relacionamento sério; o domínio através do controlo coercivo.
Tornou-se ainda claro que o fim do relacionamento em que havia abuso ou o
agressor sentir dificuldades financeiras incrementa o risco. O aumento da
intensidade e da frequência das agressões e das táticas de controlo - como é a
ameaça de suicídio - criando sentimentos de culpa na vítima devem também ser
sinais de alarme.
Os
passos seguintes são, em boa parte dos casos analisados, a mudança de
estratégia do agressor que, movido pela vingança, arranja armas e passa a
procurar oportunidades em que possa encontrar a vítima sozinha. Até que passa
ao ato, muitas vezes envolvendo outros familiares próximos, como os pais ou
filhos da companheira.
“Contamos
demasiadas vezes a versão do caso de amor que, num determinado momento passa o
limite – e isso simplesmente não é verdade”, insiste Monckton Smith. “Ao
olharmos para todos estes casos, o que encontramos é planeamento e controlo coercivo.”
A
história de Alice Ruggles, que recentemente emocionou o Reino Unido, mostra bem
como decorre esta escalada. Assassinada pelo ex-namorado em 2016, aos 24 anos,
Alice apresentou queixa inicialmente por perseguição. Tinham-se conhecido um
ano antes, no Facebook, e a ligação continuou, apesar do namorado, o soldado
Trimaan Dhillon, 26 anos, estar em serviço no Afeganistão. Até que o agressor
invadiu o apartamento da vítima, próximo de Newcastle. Trimaan ainda alegou que
Alice caiu sobre a faca que ele tinha na mão, durante a discussão. Acabou
condenado a 22 anos de prisão. O juiz não hesitou em declarar que fora um ato
de barbaridade pura.
“Tudo
poderia ter sido diferente se a polícia já conhecesse o modelo-padrão e a
escalada comum à maioria dos casos com este desfecho”, comentou já o pai de
Alice, Clive Ruggles. “Havia uma história de perseguição e de controlo. Os
sinais de alerta estavam todos lá.”
A
análise retrospetiva da situação – como acontece cá, desde 2016, nos casos já
transitados em julgado – concluiu que as autoridades do exército não
valorizaram uma acusação anterior de violência doméstica, contra Dhillon,
registada em Kent. “A informação não foi comunicada à polícia. Alice não fazia
ideia. Nenhum de nós fazia ideia...”, lamenta ainda o pai da jovem assassinada,
a assumir que nunca imaginara tal risco quando a filha começou a ser
perseguida.
A
apresentar o seu modelo a advogados, psicólogos e forças políciais, Monckton
Smith espera ainda que o facto de o seu estudo ter sido publicado no ViolenceAgainst Women Journal ajude a uma divulgação mais ampla.
“Assim”,
remata a especialista, “tanto vítimas como os profissionais de ajuda serão
capazes de dizer: “o meu relacionamento está na terceira etapa” ou “este caso
está no quinto passo” - e adotar uma estratégia que permita evitar o desfecho
comum à grande maioria de todos estes casos.
Teresa Campos (Jornalista)
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