O Governo
lançou uma campanha para abanar universitários: “Violência no namoro não é para ti”.
Até ao final do ano lectivo, esta campanha feita em parceria com as federações
académicas quer ajudar os jovens a definir barreiras e percepcionar actos de
violência no namoro. Nas universidades portuguesas este é um problema “muito
grave”, diz a APAV.
É uma
espécie de segredo público nas academias nacionais. Toda a gente sabe que
existe, mas ninguém fala sobre isso. Daniel Freitas, presidente da Federação
Académica do Porto (FAP), entende bem a distância entre a “percepção
baixíssima” da violência no namoro nos universitários e a realidade: “Não
conheço casos, não nos são denunciados, mas todos os dados nos dizem que o
problema existe.” E é “muito grave”, completa Daniel Cotrim, assessor técnico
da direcção da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV). “Os estudos
indicam que a violência no namoro no meio universitário tem índices altíssimos
e denúncias muito baixas. O número de jovens violadas também é muito alto e
esses casos também não são denunciados.”
Um estudo da
União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) divulgado no início deste ano
fez soar alarmes na equipa da secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Catarina Marcelino. Entre os 2500 jovens (entre
os 12 e os 18 anos) inquiridos, quase um quarto (22%) considerava “normal” a
violência no namoro. Por outro lado, em 2015 chegaram ao Instituto de Medicina
Legal 699 casos de violência no namoro (em todas as idades), um aumento de 44%
relativamente ao ano anterior — e isso, sabe-se, é apenas uma parte do
problema. Muitas das vítimas nunca chegam a fazer queixa.
Os dados
“são impressionantes”, diz Catarina Marcelino, “mas não surpreendentes”. A
dimensão da violência doméstica e de género em Portugal é ela própria uma prova
dos factos. Os agressores têm uma idade média de 40 anos — mas não foi aos 40
anos que se tornaram agressores. Algo falhou. Continua a falhar. “São pessoas
que nasceram e cresceram em democracia, andaram na escola no sistema
democrático. Faz-nos pensar se, enquanto sociedade, estamos a fazer o
suficiente. Não estamos.”
O perfil de
vítimas e agressores é difícil de traçar. Sabe-se que, entre os mais jovens, a
violência “é muito transversal”, aponta Daniel Cotrim, chamando a atenção para
o facto de essa realidade também se começar a notar nos números gerais. As
raparigas ainda são mais vítimas do que agressoras, mas a balança está cada vez
mais equilibrada, atingindo os rapazes “quase na mesma proporção”.
A par da
campanha dirigida aos universitários, está a ser delineada uma “estratégia
nacional de educação para a cidadania”, em parceria com o Ministério da
Educação. A ideia é dar mais competências às escolas logo a partir do 1º ciclo
e até ao ensino secundário. Actuar cada vez mais cedo — porque os relatos de violência chegam também cada vez
mais cedo.
É uma
mudança urgente. Para o psicólogo Daniel Cotrim, a intervenção devia começar
“quando as crianças entram no jardim-de-infância, por volta dos três anos”.
Acontece assim em países como a Austrália e Canadá, com resultados
inspiradores. “Parte do currículo relacionado com a cidadania é feito com as
famílias e complementado pelas escolas. Isto cria sociedades activas”. Na
prática, é olhar para a campanha feita em Portugal com a reciclagem e readaptar
a fórmula. “Hoje toda a gente recicla porque os filhos ensinaram os pais. Se
fomos capazes disso nesse campo, também somos na violência.”
A APAV dá
apoio gratuito e confidencial a vítimas de violência. Podes denunciar ou pedir
ajuda através do número grátis 707 200 077, enviar um e-mail para apav.sede@apav.pt ou
dirigires-te a um dos gabinetes de apoio à vítima da associação.